sexta-feira, 13 de agosto de 2010


Mês passado participei de um evento sobre as mulheres no mundo contemporâneo .
Era um bate-papo com uma platéia composta de umas 250 mulheres de todas as raças, credos e idades.
E por falar em idade, lá pelas tantas, fui questionada sobre a minha e, como não me envergonho dela, respondi. Foi um momento inesquecível... A platéia inteira fez um 'oooohh' de descrédito. Aí fiquei pensando: 'pô, estou neste auditório há quase uma hora exibindo minha inteligência, e a única coisa que provocou uma reação calorosa da mulherada foi o fato de eu não aparentar a idade que tenho? Onde é que nós estamos?'
Onde não sei, mas estamos correndo atrás de algo caquético chamado 'juventude eterna'. Estão todos em busca da reversão do tempo.
Acho ótimo, porque decrepitude também não é meu sonho de consumo, mas cirurgias estéticas não dão conta desse assunto sozinhas.
Há um outro truque que faz com que continuemos a ser chamadas de senhoritas mesmo em idade avançada. A fonte da juventude chama-se "mudança".
De fato, quem é escravo da repetição está condenado a virar cadáver antes da hora. A única maneira de ser idoso sem envelhecer é não se opor a novos comportamentos, é ter disposição para guinadas.
Eu pretendo morrer jovem aos 120 anos.
Mudança, o que vem a ser tal coisa?
Minha mãe recentemente mudou do apartamento enorme em que morou a vida toda para um bem menorzinho.
Teve que vender e doar mais da metade dos móveis e tranqueiras, que havia guardado e, mesmo tendo feito isso com certa dor, ao conquistar uma vida mais compacta e simplificada, rejuvenesceu.
Uma amiga casada há 38 anos cansou das galinhagens do marido e o mandou passear, sem temer ficar sozinha aos 65 anos. Rejuvenesceu.
Uma outra cansou da pauleira urbana e trocou um baita emprego por um não tão bom, só que em Florianópolis, onde ela vai à praia sempre que tem sol. Rejuvenesceu.
Toda mudança cobra um alto preço emocional. Antes de se tomar uma decisão difícil, e durante a tomada, chora-se muito, os questionamentos são inúmeros, a vida se desestabiliza. Mas então chega o depois, a coisa feita, e aí a recompensa fica escancarada na face. Mudanças fazem milagres por nossos olhos, e é no olhar que se percebe a tal juventude eterna. Um olhar opaco pode ser puxado e repuxado por um cirurgião a ponto de as rugas sumirem, só que continuará opaco porque não existe plástica que resgate seu brilho. Quem dá brilho ao olhar é a vida que a gente optou por levar.
Olhe-se no espelho...

Lya Luft



Que queremos? Ser felizes


por ANSELMO BORGES10 Julho 2010


Não há dúvida de que é realmente isso que queremos: ser felizes. Mas, quando se trata de dizer em que consiste a felicidade, encontramos tremendas dificuldades.


A felicidade é o sumo bem. Mas já Aristóteles escreveu: "Todos os homens estão praticamente de acordo quanto ao bem supremo: é a felicidade. Mas, quanto à natureza da felicidade, já não nos entendemos." Também Kant se referiu a essa coisa indefinível, que é o objecto dos nossos sonhos, trabalhos e anseios, nestes termos: "O conceito de felicidade é tão vago que, embora toda a gente deseje alcançar a felicidade, nunca ninguém consegue dizer de forma definitiva e constante o que realmente espera e deseja."


Uma das razões da dificuldade reside no facto de a felicidade ter tanto de subjectivo. A prova está em que encontramos pessoas felizes, apesar de, na nossa percepção, a sua situação as dever levar à infelicidade.


Não deixa de surpreender, por exemplo, que segundo o Happy Planet Index publicado em 2006 pela New Economics Foundation é no Vanuatu, um arquipélago da Melanésia, que as pessoas são mais felizes, no sentido de terem um grau mais elevado de satisfação com a vida. A surpresa é tanto maior quanto, comparando estas ilhas vulcânicas com os países do mundo industrializado, esperaríamos que fossem estes os mais felizes, atendendo ao seu progresso, à alta esperança de vida, oferta de bens materiais e consumo. Ora, a Alemanha, que é o quarto país mais feliz da Europa, depois da Itália, da Áustria e do Luxemburgo, ocupa o 81.º lugar na escala. Os países escandinavos estão ainda mais para trás: 112.º lugar para a Dinamarca, 115.º para a Noruega, 119.º para a Suécia e 123.º para a Finlândia, ocupando a França o lugar imediatamente a seguir: 124.º. Na China, na Mongólia ou na Jamaica, é-se mais feliz do que nos Estados Unidos, que ocupam o 150.º lugar.


Isto significa, conclui o filósofo Richard D. Precht, num bestseller inteligente e estimulante, com o título Wer bin ich und wenn ja, wie viele? (Quem sou eu e, se sou, quantos?), que devemos tirar algumas lições da experiência desta gente do Pacífico Sul: afinal, não é no dinheiro, no consumo, no poder e numa elevada esperança de vida que reside a felicidade. Se nos fixarmos na escala de valores da "economia da felicidade" (happiness economics), constatamos que a maior parte das pessoas dos países ricos se engana ao dar tanta importância ao dinheiro. De facto, no nosso sistema de valores, o dinheiro e o prestígio ocupam o lugar cimeiro, exactamente ao contrário da avaliação dos economistas da felicidade, que diz que nada causa tanta felicidade como as relações interpessoais, isto é, a vida em família, a vida de relação boa com o parceiro ou a parceira, os filhos, os amigos. A seguir, vem o sentimento de ser útil e, depois, segundo as circunstâncias, a saúde e a liberdade.


Quem coloca a base da felicidade na procura incessante de bem-estar material e de estatuto social para impressionar os outros revela um comportamento de carência e, assim, não pode ser feliz. Aliás, o capitalismo leva consigo a lógica da insatisfação: quanto mais se tem mais é preciso ter.


Quem chama a atenção para isso é Richard Layard, professor na London School of Economics and Political Science. Na sua opinião, seria necessário rever toda a lógica dos países industrializados, pois o pleno emprego e a paz social são mais importantes que o aumento do PIB. O novo slogan deveria ser felicidade para todos e não o crescimento para a economia, resume Richard D. Precht, que, referindo a World Values Survey, insiste que são as relações sociais que ocupam o primeiro lugar, de tal modo que um divórcio é tão negativo para o bem--estar como a perda de dois terços do rendimento.


Um estudo recente do ISCTE também revela que metade da população portuguesa tem dificuldades em sobreviver. No entanto, 73% dizem que são felizes e a razão principal é a família e os amigos.


O que seria a felicidade? Uma mistura de tudo isto: "uma vida agradável", com prazer, "uma vida boa", "uma vida preenchida", realizada, conclui Precht.




http://dn.sapo.pt/inicio/opiniao/Interior.aspx?content_id=1614981&seccao=Anselmo%20Borges&tag=Opini%E3o%20-%20Em%20Foco